terça-feira, 21 de abril de 2009

(.....LALO SCHIFRIN.....)




http://www.youtube.com/watch?v=3roS8cJRGEk&feature=related

A partir das transformações pelas quais passou a música de cinema nos anos 60, o argentino Lalo Schifrin desenvolveu um estilo músical único. Suas marcantes misturas de efervescente jazz, eloqüentes passagens sinfônicas e faixas de ação ritmadas garantiram sua popularidade através de gerações de ouvintes, e hoje seus talentos voltam a ser requisitados em produções de primeira linha. O premiado compositor se destaca com trabalhos originais, que misturam jazz e música clássica, além de criações cinematográficas de alta qualidade. Graças a elas, Schifrin garantiu uma posição privilegiada na galeria dos compositores contemporâneos do cinema. Juntamente com a esposa Donna, Schifrin vem lançando alguns dos seus trabalhos mais populares através da sua própria gravadora, Aleph Records. Entretanto, adquirir os direitos de certas trilhas nem sempre é uma tarefa fácil, como o próprio compositor nos conta. "O problema é que certas gravadoras, que possuem os scores, tornaram-se parte de conglomerados, e isso dificulta a negociação. Propus a Clint Eastwood uma coletânea dos filmes de DirtyHarry, e chegamos a um acordo em termos de royalties. Pareceu muito fácil, até que os advogados do estúdio, por uma questão de princípios e por desconhecerem meu bom relacionamento com Clint, negaram o acordo. Posteriormente eu e minha esposa, que preside a gravadora, procuramos os advogados e conseguimos lançar o CD. No momento estamos preparando Mannix, porém estamos com dificuldades para obter a gravação original, lançada apenas em LP. Vou ter de regravá-la com músicos diferentes enquanto estiver na Europa, realizando concertos." Recriar trilhas do passado na Europa tornou-se uma solução comum e econômica para muitos compositores, apesar de ter suas armadilhas. "As trilhas mais difíceis de regravar são aquelas que combinam jazz e música sinfônica. Por exemplo, como refazer Cool Hand Luke na Europa? A tabela do sindicato em Hollywood é alta, e eu não os culpo porque eles possuem os melhores instrumentistas do mundo. Se precisar de gaitas de boca, banjos, em que outra parte do mundo vou achar músicos que os toquem do modo apropriado? Você precisa de alguém que leia e toque rápido estes instrumentos, na marcação exata."

Schifrin nasceu na Argentina, e foi em Buenos Aires que, em 1958, tocando piano em um clube de jazz, foi descoberto pelo famoso trumpetista Dizzy Gillespie . Após seu ingresso no grupo de Dizzy, passou a ser requisitado por famosos jazzistas e compositores, como o maestro Quincy Jones. Mas foi apenas quando desembarcou em Hollywood que viu seu talento ser reconhecido pelo grande público. Após o grande sucesso do tema e trilhas compostas para a popular série de TV Missão Impossível, Schifrin foi contratado pelos grandes estúdios, para os quais compôs em três filmes idealizados para tornar Ann-Margret uma estrela: Once a Thief (com Alain Delon), The Cincinnati Kid (com Steve McQueen), e a sátira aos filmes de espionagem protagonizada pelo agente Matt Helm, Murderers Row (com Dean Martin). Sua maestria em criar excelente música de suspense e ação também foi utilizada em séries como O Agente da U.N.C.L.E, Mannix e os filmes The President's Analyst, com James Coburn, and The Liquidator.

Apesar de Schifrin ter tido a sorte de ver alguns de seus primeiros trabalhos lançados em vinil, os interesses comerciais estavam mudando. "A Verve Records fez uma compilação de algumas faixas de Once a Thief. Quando cheguei em Hollywood, eOnce a Thief foi um de meus primeiros filmes lá, Henry Mancini havia com sucesso mudado a arte e o formato dos álbuns de trilhas sonoras. Ele pegava um trecho ouvido no filme, e o desenvolvia em uma nova faixa gravada especialmente para o álbum. Claro, havia um tema principal - 'Moon River,' 'Days of Wine and Roses.' A MGM quis que eu fizesse o mesmo. Peguei trechos deOnce a Thief e fiz um álbum comercial para ser tocado nas rádios, que à época realmente colocavam no ar música de cinema. A KABC, por exemplo, tinha uma grande audiência. Já as gravações originais, aquelas realmente utilizadas no filme, eram esquecidas. Quando uma nova administração assumiu a MGM, o presidente do estúdio foi até os arquivos musicais e perguntou 'O que é isso?' Isso eram as gravações de alguns dos maiores compositores, como Miklos Rozsa. E ele disse 'Queimem, vamos utilizar este espaço.' À época os grandes estúdios estavam se desintegrando, e estavam alugando salas para muitas companhias independentes. Por sorte, o responsável pelo arquivo na época, Harvey Taylor, me chamou e perguntou se eu queria salvar alguns dos meus scores. Alguns nem eram as gravações integrais, mas versões condensadas para pianistas e regentes. Eu possuo The Cincinnati Kid assim. Também houve um incêncio em Hollywood, quando muitas trilhas queimaram - minhas, de Mancini, de todos. Na Warner Brothers houve uma inundação onde muitas trilhas e fitas ficaram inutilizadas. Na MGM, queimaram a trilha deDoutor Jivago! Todo mundo sabe disso. Maurice Jarre foi para Londres reger uma orquestra chamada Filmharmonic, e reconstruiuDoutor Jivago! Eu não sei como ele conseguiu."

Após ter se estabelecido firmemente na indústria, Schifrin marcou o final dos anos 60 e o início dos 70 com trilhas dinâmicas e funky, avidamente disputadas por colecionadores. A primeira foi o sucesso inesperado de 1968, Bullitt, no qual Steve McQueen participou, em São Francisco, de uma das mais espetaculares perseguições automobilísticas das telas. "Não escrevi qualquer música para a perseguição de Bullitt. Compus uns cinco minutos de música que antecedem à perseguição, que cessa no exato momento em que Steve McQueen acelera bruscamente. Disse ao diretor que seria o melhor a fazer, havia dois carros na cena e o público deveria concentrar-se apenas nos sons da perseguição. Eu fiz cenas semelhantes, como em Dirty Harry na Lista Negra com o carro de brinquedo, e em The Mean Season (com Kurt Russell and Mariel Hemingway)."

Além de Dirty Harry na Lista Negra, Schifrin compôs para outros três filmes da popular série da Warner protagonizada pelo detetive Harry Callaham. Em Dirty Harry (Perseguidor Implacável), Clint Eastwood era um tira que desafiava o sistema, fazendo justiça com as próprias mãos. "Esses filmes eram diferentes, devido à época e às suas histórias. Contrapondo-se a um estilo europeu de filmar, muito apreciado à época, na série Dirty Harry vemos o estilo americano por excelência. Há muita ação e movimento - o personagem de Eastwood está sempre indo de um lugar para o outro, e não sabemos porque, e nem o que ele fará em seguida. Realmente não criei um tema para Clint Eastwood, mas alguns motivos. Um é ouvido quando ele está investigando ou em ação, mas ele não é um herói no sentido tradicional, é diferente do personagem que ele interpretou para Sergio Leone, com a música de Ennio Morricone. Há um tema sisnistro para Scorpio, o vilão. Próximo ao final surge um outro, mais emocional, trágico. Ele está limpando o lixo da sociedade, e é um tema depressivo.Magnum 44 foi totalmente diferente, já que os vilões eram policiais. Em Impacto Fulminante há uma história de vingança, com um tema de parque de diversões para os flashbacks. Cada um desses filmes foi diferente, e a única coisa que permaneceu em todos foi o tema curto para Dirty Harry, que acabou transformando-se na canção ouvida ao final de Impacto Fulminante, cantada por Roberta Flack."

O diretor de Dirty Harry, Don Siegel, já era um diretor respeitado, e sua parceria com Schifrin resultou em alguns de seus melhores filmes. "Don era um cara divertido, e de certo modo me lembrava Dizzy Gillespie. Dizzy era muito seguro de si, e possuía um grande senso de humor, exceto quando se tratava de música - aí ele ficava muito sério. Don e eu gostávamos do que fazíamos e entendíamos o que cada um desejava. Fiz Meu Nome é Coogan, The Beguiled, Dirty Harry, O Telefone e Charley Varrick (O Homem que Burlou a Máfia) para ele. Charley Varrick possuía um plano para enganar a Máfia, a polícia, todo o mundo. Você não sabe qual é o plano, então a música tem de dizer o que ele está pensando. Foi muito difícil! Don Siegel incentivou muitos jovens diretores, como John Cassavetes. Ele encorajou Clint Eastwood para tornar-se diretor; chegou a interpretar um barman no primeiro filme de Clint, Play Misty for Me (Perversa Paixão). Don e eu pregávamos peças um no outro. Por exemplo, Charley Varrick inicia em uma cidadezinha de Nevada durante os anos 70. Nos primeiros minutos há um violento assalto a banco, mas pelas cenas de abertura você não desconfia que irá assistir a um filme de ação. Usei uma espécie de pastoral gentil, no estilo de Aaron Copeland, para contrastar com o fato do protagonista ser um ladrão. Foi então que Don entrou no estúdio de gravação, para assistir aos créditos iniciais. Estávamos ensaiando e Don não podia ouvir o som na cabine, portanto não sabia o que eu estava dizendo à orquestra. Sabia quando iriam surgir as palavras "Directed by Don Siegel," e disse aos músicos que, nesse exato momento, eles fizessem exatamente o contrário do que havia escrito. Continuamos com nossa música suave, mas quando o nome de Don surgiu, foi um completo pandemônio musical! Ele quase teve um ataque cardíaco, mas logo percebeu que era uma piada. Para se vingar, algum tempo depois ele me mostrou um filme pornográfico com a música de Charley Varrick de fundo. E lá estava a minha bela pastoral, enquanto na tela uma mulher "brincava" com um cavalo! Pensei "Bem, agora tenho um futuro na indústria pornográfica!" Isso lhes dá a idéia de como era divertido trabalhar para Don."

Em 1971, o mesmo ano de Dirty Harry, Siegel e Schifrin também fizeram The Beguiled (O Estranho que nós Amamos), uma espécie conto de horror gótico situado durante a Guerra Civil americana, na qual um soldado ianque ferido (Eastwood novamente) é tratado em uma escola de moças. Ele logo aproveita a situação para obter favores sexuais, mas logo aprende que não há nada pior que uma mulher sulista desprezada. "The Beguiled é o melhor filme e a melhor trilha que fiz. É o score que eu mais desejo regravar, tornar conhecido. É uma pena que a gravação original nunca tenha sido lançada. Esse filme deveria ser exibido em escolas para diretores, para que aprendam todas as técnicas e linguagens cinematográficas que contém. Don quebrou  muitas regras contando aquela história, e ele a contou da melhor maneira possível."

Enquanto os anos 70 passavam, Schifrin começou a diversificar seus projetos. Já havia sido bem sucedido com The Fox, do diretor Mark Rydell, e teve  contato com a ficção-científica através do primeiro filme de  George Lucas, THX-1138. Os grandes projetos continuaram, incluindo o clássico das artes marciais Operação Dragão e o drama da 2ª Guerra The Eagle Has Landed (recentemente lançado em CD pela Aleph). Compôs uma trilha magistral para O Exorcista, que foi descartada de modo no mínimo indelicado pelo diretor William Friedkin. Retornou para o terror em grande estilo com The Amytiville Horror. Nos anos 80 e até o início dos 90, Schifrin fez esporádicos trabalhos para o cinema (O Casal Osterman, FX2) talvez por descaso dos diretores. Agora, com sua música presente em filmes tão diversos como Tango, de Carlos Saura, e A Hora do Rush, o sucesso estrondoso de Jackie Chan e Chris Tucker, toda uma nova geração de cinéfilos está descobrindo a arte versátil do talentoso Lalo Schifrin.


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